Pântano
Venho, por este meio, apelar ao sentido de responsabilidade dos membros do governo e cúpulas partidárias. O espetáculo miserável que as elites políticas têm proporcionado ao país é surrealista. É, hoje, absolutamente claro que os membros do governo e os líderes partidários da oposição não estão à altura da responsabilidade que o país tem demonstrado desde o início desta crise.
- falar ao país e não dizer nada:
O primeiro-ministro do país falou, nas últimas semanas, duas vezes ao país e não foi capaz de esclarecer os portugueses em relação às medidas e, sobretudo, ao caminho que quer seguir. A falta de transparência do seu discurso é absolutamente fatal para a aplicação de qualquer programa de reformas que exigem o sacrifício dos cidadãos. Se o primeiro-ministro está certo do caminho a seguir, tem de estar absolutamente seguro das medidas que pretende implementar e dos resultados práticos das mesmas. Não chega dizer que não pode prometer que não venham a ser exigidos mais sacrifícios. Tem de ser absolutamente claro quanto aos cenários em que recorrerá a mais medidas.
Mais. Porque falhou a previsão para o défice deste ano? O governo controla a despesa, mas tem controlo sobre a receita que depende do consumo da sociedade, disse o primeiro-ministro. Pergunta o país, porque é que o consumo caiu e, consequentemente, a receita? Como consequência das políticas do governo? Foi previsto o carácter recessivo das políticas aplicadas nas receitas arrecadadas?
Mais ainda. Em quanto se cifrará o défice deste ano? Que medidas serão aplicadas para atingi-lo?
- a TSU:
Todo o país está contra a medida. Só há duas pessoas em Portugal, eventualmente três, que acreditam no benefício da medida: o primeiro-ministro, Carlos Moedas e eventualmente o ministro das finanças. Mais ninguém defende tal medida: economistas, políticos, sindicalistas ou patrões. A não ser que o primeiro-ministro considere que foi ungido por inspiração divina e que todos devemos seguir a sua fé, tem que vir a público descrever cabalmente o benefício da medida que justifique o confronto com os parceiros sociais.
- a política:
Portugal não tem, actualmente, governo. O espetáculo público proporcionado nos últimos dias descredibilizou a coligação e desautorizou o primeiro-ministro. O CDS demonstrou uma evidente ausência de sentido de Estado. Paulo Portas mostrou que não é fiável nem responsável. O discurso patriota é boçal quando feito numa declaração que deita por terra uma coligação de governo.
Desejaria que o PSD se deixasse de encenações que fragilizam o partido perante a opinião pública. Convocar os órgãos políticos, aumentando a tensão política, para por fim "baixar a bola" como disse Marcelo Rebelo de Sousa é vexatório e politicamente incompreensível.
Ao PSD, e ao primeiro-ministro, não interessa manter a actual coligação. Essa estratégia seria adiar um desastre inevitável, com consequências negativas para a governação e para o país. Resta a dissolução da coligação de governo e a negociação de um pacto parlamentar entre os dois partidos (idealmente três, incluindo o PS) relativo, estritamente, às medidas previstas pelo memorando de entendimento.
Manter o actual governo de coligação significa arrastar o país para um cenário de eleições antecipadas em 2013 com consequências obviamente muito gravosas para os dois partidos da coligação mas, sobretudo, para o PSD.
- Presidente da República:
Estará, muito provavelmente, tentado a não agir na resolução da actual crise política. Perderá uma oportunidade única para prestigiar a sua imagem, fragilizada desde a polémica em torno das suas reformas. A manutenção do "status quo" levará a que seja co-responsabilizado pela crise política que se agravará em 2013 com a precipitação de eleições.
- Tribunal constitucional:
A situação política e social é tão surreal que afastou, momentaneamente, o fantasma da inconstitucionalidade das medidas do Orçamento de Estado de 2013. A concretizar-se tal cenário, saberei finalmente que tudo isto é um pesadelo e que acordarei em breve...