Papa Bento XVI resigna ao lugar...
Em 2005 Joseph Alois Ratzinger era eleito sucessor de Pedro, adoptando o nome de Bento XVI. Ratzinger, durante o papado de João Paulo II, tinha sido uma das figuras prominentes da hierarquia eclesiástica, tendo dirigido como Prefeito, com inspiração divina, a importante Congregação para a Doutrina da Fé.
Se pudermos estabelecer, de forma pouco exaustiva, as grandes diferenças entre João Paulo II e Ratzinger, chegaremos a uma conclusão que ultrapassa a diferença e encontra na complementaridade o seu aspecto mais particular. João Paulo II proclamou, num momento de viragem da história do mundo, do marxismo à democracia, a mensagem da caridade, do trabalho e da importância dos leigos. Ratzinger, que participou activamente no produto final do papado de João Paulo II, acrescentou, se assim pudermos resumir, um elemento estrutural sem o qual a caridade não sobrevive, a Fé.
A caridade deve surgir e desenvolver-se, na linha do pensamento de S. Tomás de Aquino, orientada pela recta razão. E a adesão ao esteiro de Cristo pressupõe a fé. A fé é um dom concedido por Deus e não algo inato ao Homem e desenvolve-se e floresce pelos estímulos proporcionados por Deus.
Ratzinger instituiu a Fé como elemento máximo do seu magistério papal e proporcionou aos crentes os instrumentos e caminhos para a desenvolver. Será pretensioso da minha parte exaurir todos os contributos de Bento XVI na sua vida como crente e como Papa, mas um aspecto se destaca. Bento XVI cararacteriza-se pelo seu dom humano e intelectual. Bento XVI tem sido anunciado como um dos melhores pensadores da Igreja contemporânea. Se João Paulo II tinha sido próximo das pessoas em geral, Bento XVI foi conquistando estas e conquistando os intelectuais.
Num mundo em que se percebe que o desenvolvimento tecnológico não se mostra suficiente para a plena concretização do Homem, Bento XVI relembra que «a vida eterna» é um bem e um fim que pode ser alcançado desde hoje. A «vida eterna» é a superação da morte, que pode suceder antes mesmo da morte (vd. Carta Encíclica Spe Salvi, Salvos na Esperança). Bento XVI renovou em palavras frescas os textos que muitos consideravam antigos e ultrapassados, lembrando Cristo como A Pessoa e Deus próximo, unido ao Homem numa história eterna de amor agapé.
O seu trabalho como catequista da humanidade está presente quase desde o início do «estrelado» da sua vocação. As suas encíclicas são inspiradoras nesse trajecto, bem como todos os textos que vem produzindo e que visam orientar e aclarar os textos biblicos num mundo cada vez mais consumido por si mesmo e pela doutrina do mal.
O seu amor a Cristo, a sua genuinidade, a sua simplicidade, a sua velhice ternurenta, todos estes elementos fazem de Bento XVI um Papa marcante. Lendo alguma da literatura sobre a história e influência do mal nos dias de hoje, rápido se percebe que Bento XVI, Homem genuíno, é visto como uma das ameaças mais assinaláveis no século àquele, porque assenta a sua vida na Caridade e na Fé. Ao mesmo tempo, proclama, viva voz, a mensagem da esperança, fechando, por essa via, o círculo das virtudes teologais.
Bento XVI é um homem ímpar, de simplicidade marcante.
Tive o gosto de poder assistir e presenciar isso mesmo o ano passado, quando assisti em Roma às celebrações pascoais. Bento XVI colocou-se na sua figura de Homem aos pés de Deus, pela Humanidade. Enfrentou, até, alguns dos momentos mais difíceis da história da Igreja moderna, quando se viu confrontado com escândalos de pedofilia entre os servidores de Deus. Mas assumiu com frontalidade o problema, tornando públicas as orientações para toda a Igreja saber enfrentar essa influência do mal e perturbação do Homem. Todas essas posições públicas podem ser consultadas no site do Vaticano.
Bento XVI marca a Igreja, num momento de viragem do mundo, deixando como mensagem fundamental do seu magistério papal Cristo e o Homem, como figuras e pessoas indissociáveis, na relação entre o Criador e a Criação...
Se tiver de destacar um importante escrito, de leitura universal, devo referir a vida de «Jesus de Nazaré», em três volumes. Isto porque todos os caminhos de Bento XVI terminam em Cristo, Deus tornado homem em Jesus, que viveu bem perto de nós e nasceu em Nazaré.
Mas Bento XVI não resigna sem antes deixar preparado o futuro da Igreja. Tal facto é visível nas nomeações de Bispos que fez nos últimos anos. Indicou homems intelectuais e trabalhadores, que viveram perto das suas populações nos anos anteriores e que evidenciaram uma vocação forte. Homens jovens e capazes de dialogar com o mundo de hoje.
Não deixa de ser curioso, também, o momento para esta resignação. A Igreja atravessa um período de acalmia, depois de períodos extremamente difíceis como aquele a que já me referi. Mas, mais importante, Bento XVI resigna no decurso do Ano da Fé, iniciado no final de 2012. É como se o Pastor dissesse às ovelhas: «ide, a Vossa Fé vos iluminará».
Apesar da sua resignação, que demonstra até o seu desprendimento e o quão bem compreende a sua missão, esperemos que possa Bento XVI continuar a influenciar positivamente e por largos anos a vida da Igreja.
Um Bem-haja ao Papa Ratzinger, sucessor de Pedro como Bento XVI...