Irresponsabilidade ou Igreja Caviar?

Paulo Colaço, 17.03.09

Bento XVI insistiu hoje que o problema da seropositividade "não se pode resolver com a distribuição de preservativos", pois que, "pelo contrário, isso só irá complicar a situação".

O Vaticano recomenda abstinência sexual no combate à propagação da SIDA e é nessa linha que Bento XVI se manifesta na sua viagem a África. Link

23 comentários

Bruno Ribeiro 17.03.2009

Confesso que não consigo perceber essa frase do "só irá complicar a situação"...

A recomendação de abstinência é uma forma porreira de esconder a cabeça na areia. Também podemos deixar de andar de carro para evitar os acidentes na estrada, deixar de apanhar sol para evitar as insolações ou mesmo deixar de dar comida às crianças para evitar a obesidade infantil.

Já agora, pergunto a alguém mais bem informado do que eu: qual é a posição da Igreja em relação à pílula? E ao DIU? E aos anéis vaginais? E aos espermicidas? Penso que serão contra todos eles, certo?
Paulo Colaço 17.03.2009

Contra a pílula já foi.
Tal como contra a vida dos hereges.
A Igreja até vai reconhecendo erros, mas com que atraso?
E com que custo para as vidas dos crentes?
Bruno Ribeiro 17.03.2009

Pois... aguardo mais informações mas se já não é contra a utilização da pílula gostava de saber porque é contra o preservativo.

Eu sempre pensei que fosse por ser um método anti-concepcional e como tal a Igreja Católica não o defendia por permitir o acto sexual sem finalidade de reprodução...

jfd 17.03.2009

Bento XVI diz que preservativos agravam combate à sida
13h40m
O Papa Bento XVI defendeu esta terça-feira que a solução para o problema da sida não passa pela distribuição de preservativos, horas antes de aterrar na capital dos Camarões para a sua primeira visita ao continente africano.

"Não se pode resolver (o problema da sida) com a distribuição de preservativos", disse o Papa aos jornalistas a bordo do avião da Alitália que o levará até Yaounde, nos Camarões. Acrescentou que, "pelo contrário, a sua utilização agrava o problema".

Esta é a primeira vez que Bento XVI fala explicitamente no uso de preservativos. A Igreja Católica, que se afirma na linha da frente do combate à sida, encoraja a abstinência para impedir a propagação da doença.

A oposição da Igreja ao uso de preservativos é questionada por padres e freiras que trabalham com vítimas da sida em África.

O Papa estimou ainda que a solução passa por um "despertar espiritual e humano" e pela "amizade pelos que sofrem".

Bento XVI adiantou ainda que pretende apelar à "solidariedade internacional" com África no contexto da actual crise económica, ressalvando que a Igreja não propõe soluções económicas específicas, mas pode dar sugestões "espirituais e morais".

Atribuindo a actual situação económica a um "défice de ética nas estruturas económicas", o Papa disse que é "aqui que a Igreja pode dar o seu contributo".

O Papa Vento XVI deixou Roma hoje de manhã rumo aos Camarões, primeira etapa de um périplo de sete dias pelo continente africano, que o levará também a Angola.

Bento XVI deverá aterrar no aeroporto de Yaounde cerca das 16:00 locais (15:00 GMT).

A sida tem um impacto devastador em África, particularmente em países da África Austral como o Botswana, Suazilândia e África do Sul, os mais afectados em todo o mundo.
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Guilherme Diaz-Bérrio 17.03.2009

Subscrevo o Bruno: a solução para os acidentes é não andar de carro?

Esta é daquelas questões em que eu não concordo muito com a posição da Igreja. Embora, é preciso compreender duas coisas:
a) Para a igreja, sexo serve um único objectivo: "multiplicai-vos". Não para "prazer imediato". O preservativo serve exactamente para o oposto. Podemos não concordar, mas são coerentes: Sexo é para procriar, com parceiro único, após votos de casamento e fidelidade. Se formos fieis a estes princípios, em teoria a SIDA não se propaga.
[Não estou a dizer que concordo com a visão, mas entendo o argumento que está por detrás dele].

b) A Igreja é uma instituição extremamente pesada. Ela evolui, mas tem um enorme "lag" nessa evolução. Por isso, dá sempre a sensação de estarem atrás do tempo, mas... por outro lado... isso confere-lhe alguma credibilidade como "ancora de estabilidade" para quem a queira seguir.

Opções... somos livres de ignorar os apelos, quando não concordamos.
jfd 17.03.2009

Gui percebo o que dizes, mas como se encaixa aí o caso que o Paulo refere; a pílula?

Quanto ao ignorar, só posso ignorar aquilo que não me interessa.
E quanto ao lag, com este Papa, vai-se tornar gigante. Um retrocesso que nunca imaginei.
Desde os dias de tristeza pela morte de João Paulo II, até à Euforia da tarde do fumo branco, até às primeiras preocupações de tempos preocupantes para o Vaticano, muito tem-se vindo a concretizar com uma ou outra abertura aqui e ali, como o extraórdinario acto de contrição efectuado nos EUA.

Guilherme Diaz-Bérrio 17.03.2009

A pilula, do ponto de vista da Igreja encaixa na mesma temática que o preservativo: estás, para eles, a esvaziar o acto fundamental de criação de vida para obteres só prazer imediato.

Quanto a este Papa, confesso que tinha muito mais medo. Não o acho assim tão reaccionário. Também não estejas à espera que ele venha dizer que é favor de meios anti-contraceptivos, pois isso vai contrário à doutrina dele: o Sexo, para ele, é o acto fundamental de criação de vida, não algo que devas usar a teu "belo prazer".

Podemos concordar [ou não, e pessoalmente não sou tão extremista], mas tens de lhe conceder: está a apenas a ser coerente com a doutrina que defende.
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Bruno Ribeiro 17.03.2009

É verdade que esta posição é coerente com aquilo que a Igreja defende como "princípio". Disso não tenho dúvida e é exactamente aí que está o problema.

Porque uma instituição com este peso e com este simbolismo não devia abstrair-se assim de contribuir com soluções para dramas como o flagelo da SIDA.

Dizer que "sexo só dentro do casamento, sempre com a mesma pessoa e apenas para procriar" é completamente irrealista. Recomendar anstinência também e a Igreja Católica já devia ter percebido isso até porque lhes anda a sair bem caro pagar indemnizações a crianças abusadas por padres.

A partir do momento que Bento XVI não está a ser realista no encarar desta situação, está a abster-se, isso sim, de ajudar a resolver o problema. E está a fazê-lo exactamente por falta de capacidade da instituição que representa em conseguir acompanhar os tempos.

Não defendo agora que a Igreja Católica se desvirtue e contradiga tudo o que disse até aqui. Mas deverá reflectir sobre o papel que tem na Humanidade e pensar se tem mesmo estado a tomar o rumo certo...

É que aqui há uns anos eles também acharam que torturar e matar pessoas era o rumo certo.
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Nélson Faria 18.03.2009

Há momentos em que vale a pena saltar o muro de uma natural resistência e entrar no campo da aceitação.

Se outra pessoa dissesse que o preservativo não é a cura para a SIDA, duvido que a sociedade entrasse em choque: efectivamente não é. Será, quanto muito, uma forma de controlar e\ou restringir a doença.

Quando o Papa nos diz que o preservativo não é solução, ele olha o problema bem nos olhos o problema e aponta o caminho. É duro para lá do que estamos habituados, mas é o comportamento certo de um líder moral: ele diz-nos, com todas as letras, que o problema é acima de tudo de comportamento, e fala-nos em renascimento espiritual e faz-nos um apelo a que alteremos a nossa forma de ser e de estar.

Ter religião é - para os católicos - um desafio diário com Deus em Cristo, não é um certificado de bondade. A Igreja não se resume aquilo que o homem é ou à aceitação do Homem pelo que ele é: a Igreja fala-nos da promessa do Homem, daquilo a que ele deveria aspirar, de algo superior às exigências do "homem médio".

Neste campo, como noutros, a Igreja faz mais que pregar o bem, pois está directamente no campo e pratica-o.

Apesar da oposição oficial da Igreja ao preservativo, muitos padres e freiras distribuem o profiláctico aos portadores de HIV. E a Organização Mundial de Saúde publicou recentemente um relatório, segundo o qual pelo menos 30 por cento das infra-estruturas de saúde em África estão ligadas a instituições religiosas e 27 por cento dos centros de tratamento de sida estão ligados à Igreja Católica. O Vaticano tem insistido no acesso dos mais pobres aos medicamentos.

Público versão impressa

Este excerto mostra a riqueza, a vocação e a mensagem de uma Igreja que é algo a acolher e a olhar como fonte de esperança, e não de miséria, uma Igreja enquanto auxílio e não como obstáculo.
Nélson Faria 18.03.2009

Este é um brilhante exemplo daquilo que eu vos tenho vindo a falar: ser católico não é sinónimo de concordar com o Papa, ou com este Bispo em detrimento de outro... há lugar para todos, há muita heterogeneidade na homogeneidade da Fé

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