Singularidades de uma Rapariga Loura
Começo por vos dizer que o meu caso é simples - e me chamo João Lemos Esteves.
Após uma semana verdadeiramente alucinante, senti-me exausto. Muito exausto. E que melhor maneira de dar um novo alento, um novo suplemento de energia à alma que recorrer àquela que é considerada a sétima arte, a arte de enquadrar numa tela as contradições, os nosso sonhos, os nossos medos, as nossas paixões, obsessões - enfim, a vida? Decidi:fui ao cinema.
Vi " As singularidades de uma rapariga loura", de Manoel de Oliveira. Por uma razão: Eça de Queirós é o meu autor de eleição - e foi precisamente este conto o primeiro que li e que me incutiu o gosto pela leitura. Tinha, então, 9 ou 10 anos de idade.
Quanto ao filme, reflecte os traços cinematográficos característicos de Oliveira- planos fixos, pouco movimento, pouco dinâmica, mas grande poder de encaixe das diversas cenas entre si. Bem adaptado - mas com uma indefinição quanto ao tempo da história, elementos da sociedade do século XIX intercalados com notas de euros (aspecto menos positivo do filme). Porém, o que verdadeiramente gostei foi a possibilidade de reflectir, em plena sala de cinema(era o único espectador! Sintomático do estado do cinema português...) quão limitada é a racionalidade do homem. Seremos guiados essencialmente pela razão ou essencialmente pela paixão? Será possível um meio termo neste confronto dialéctico?
Iniciei este post tal como começa o conto, tal como se refere o pobre Macário (começo por vos dizer que vos dizer que o meu caso é simples- e me chamo Macário). Era um homem racional, contido nas suas emoções- até ao dia em que viu Luísa Vilaça, uma jovem loura, que abanava deliciosamente o seu leque. Como se imagina, Macário cometeu as maiores loucuras por ela. Afinal, ela era uma farsa...
A verdade é que o pobre homem condicionou toda a sua vida em função daquela mulher. Eu próprio, que me assumo como racionalista, já fui (e gosto) de ser capturado intelectual e emocionalmente pela sensibilidade e beleza de uma rapariga loura de olhos azuis. Com todas as suas singularidades. Afinal de contas, não é isso que alimenta e estimula esse mistério insondável que é a vida?