Mais um apertão previsivel
Sócrates diz que não há justificação para subida dos juros da dívida
Em declarações ao jornal britânico, José Sócrates disse não ver “nenhuma razão para os juros das obrigações subirem”. “Vejo boas razões para elas descerem”, adiantou.
Público, 04 Nov 2010
Há um ditado em Portugal muito antigo (e deveras sábio): Na primeira caiem todos, à segunda cai quem quer e à terceira cai quem é parvo.
Bem, a verdade é que já passamos o PEC III, e caminhamos a passos largos para o PEC IV, e os investidores já não caiem mais. No final do dia estão a emprestar dinheiro a quem já disse 3 vezes que ia corrigir o problema. Todos nós vimos bem a correcção do problema. Politica Fiscal, Financeira e Monetária (não temos a última mas também se aplica) tem um pilar básico: Credibilidade. E este governo nem crédito nesse campo tem.
Infelizmente, não basta mudar de actores. Ajuda bastante (e pelo menos resolve o problema da Credibilidade), mas o problema em mãos é um pouco mais profundo: Sustentabilidade Dinâmica do Orçamento.
A estabilidade das contas públicas é avaliada por uma condição simples: A longo prazo a trajectória do saldo tem de ser estável, e os defices não se podem alimentar a eles próprios. Se o for, mesmo um defice de curto prazo pode ser corrigido de forma mais ou menos fácil. Um defice alimenta-se a ele próprio na forma mais básica quando pagamos juros de dívida com mais dívida. É matemática simples: pedimos um crédito para pagar o juros do Cartão Gold com que compramos o Plasma e as férias à Jamaica.
Nem sempre é mau: se no final do dia o juros do crédito novo pagar o crédito antigo a taxas mais baixas, é uma boa gestão de dívida. É o fundamento das consolidações de crédito. Excepto se uma condição não estiver a ser cumprida: O crescimento da dívida tem de ser sempre inferior ao crescimento da Economia descontado dos juros que estamos a pagar. Matemática simples: os meus rendimentos crescem mais depressa que as prestações que pago pela minha dívida, logo eu peço um novo crédito para pagar os antigos, a taxas mais baixas, e vou progressivamente equilibrando o meu balanço. Se cresço menos do que aquilo que pago, o meu rendimento vai decrescer.
Para os que estão a pensar "Sim, Guilherme, já falaste disso pela 'n-ésima vez'... porque é que insistes?", a resposta é simples:
Se equilibrasse-mos as contas públicas num saldo zero, se mantivesse-mos a despesa constante, se mantivesse-mos a base fiscal igual, o défice e a dívida continuariam a crescer! E não vejo ninguém a pegar neste pequeno pormenor.
O objectivo de qualquer governo (PSD, PS, Marcianos, <inserir aqui a vossa escolha>) terá sempre de ser, no mínimo um excedente orçamental de 3% para manter tudo constante. Para voltar a fazer descer a dívida pública, com o nosso crescimento potencial, temos de ter um excedente orçamental a rondar os 5%. Ou seja, o objectivo não é, não pode ser, não deve ser, ir de -9,3% para 0%. É ir de -9,3% para +5%. São 15 pontos percentuais de esforço! E isto não se resolve nem com discursos, fotos de acordos ou credibilidade.
Moral da história: Ainda vem ai o PEC IV, e talvez o V. Se o FMI não vier antes. Ainda não estamos sequer a caminhar para colocar as finanças em ordem. E é por isto que os juros não param de subir.
PS(D): e sim, política fiscal de correcção orçamental pode ter um efeito de crescimento económico, se for bem feito, com condições muito especificas. O que não é sequer o caso, olhando para o OE2011.