O Regresso da História I – Mitteleuropa Redux
Fernando Martins do Cachimbo de Magritte, causou polémica com o seu recente post ‘germanófobo’. Martins merece ser louvado pela sua coragem em romper com o politicamente correcto e descrever a dura realidade deste novo século que anuncia mais uma vez uma ascensão teutónica que tem cada vez mais vindo a dominar a Europa.
Dito isto, Miguel Morgado tem razão ao apontar a lacuna da falta de explicação para este ressurgimento Alemão.
A Alemanha tem desde há vários séculos vindo a emergir como uma potência europeia. Foi uma corrida para o topo que começou há um milénio atrás com o Sacro-Império Romano-Germânico. As fracturas políticas no entanto impediriam a união política até ao século XIX. A Reforma conseguiu reavivar o nacionalismo alemão e o Império Austríaco foi o primeiro a abrir o espaço geopolítico na Europa central para uma potência continental. Mas a Áustria viria derradeiramente a perder a competição com a Prússia para a conquista do estatuto de ‘estado sucessor’ do Sacro-Império.
Este progresso não teria sido interrompido não fora pela intervenção extra Europeia nos assuntos geopolíticos do velho continente que a América de Woodrow Wilson inaugurou. A participação dos EUA nas duas guerras mundiais foi o principal factor da queda da Alemanha enquanto super-potência regional e tal como a América decide hoje virar-se para a Ásia, também os seus esforços de adulterar artificialmente o panorama geopolítico europeu a seu favor, se começam a desvanecer.
A Alemanha do pós-guerra encontrava-se em ruínas e ironicamente vítima do mesmo estilo de partição que por sua vez havia imposto à Polónia um século antes. Devido à ameaça do bloco soviético os Aliados concordaram em reunificá-la mas apenas na sua vertente ocidental, criando assim um estado tampão reminiscente da Confederação do Reno napoleónica, desta feita concebida para servir os propósitos dos Aliados e não da França.
A excisão da Alsácia-Lorena, da Prússia, Pomerânia e Silésia à Alemanha, a devastação nas suas infra-estruturas e a endoutrinação pacifista devolveram à Europa o equilíbrio geopolítico continental ao igualar a França e a Alemanha em termos de poder. O ‘tandem’ Paris-Bona era aliás tão estável que deu origem a formas de cooperação sem precedentes como os Tratados de Roma e respectivas reencarnações.
Mas o fim da Guerra Fria trouxe consigo a fria realidade de que a economia Alemã, ao dominar o vale renano, sempre havia sido mais eficiente que a Francesa e o quarto alargamento – ou o alargamento mudo – ao permitir à Alemanha anexar a RDA, alterou definitivamente o equilíbrio de forças na Europa. Lembra bem o Fernando que ‘(…) a então União Soviética e os EUA só aceitaram a unificação da Alemanha depois de uma dura embora rápida negociação’.
Hoje vivemos também o regresso da história: aqueles que pensavam que o fim da URSS significaria o triunfo eterno da democracia liberal começam a perceber que o predomínio global do demo-liberalismo está inexoravelmente dependente da vitória na Segunda Guerra Mundial dos países aonde se deram as revoluções atlânticas – Inglaterra, França, América – o que lhes permitiu moldar o mundo à sua imagem. Ora como pode toda esta estrutura normativa sobreviver quando as novas potências – China, etc – não partilham destes valores?
Duas bolhas rebentaram: a da 'supervisão' Americana sobre a Europa e a do demo-liberalismo ad eternum que com a sua versão pós-moderna da 'paz democrática' traria cooperação ilimitada e desinteressada entre os estados. A História regressou e parece que os estados continuam a ter interesses divergentes.
Aonde eu discordo do Fernando Martins é na análise moralizadora (negativa) que ele faz da primazia Alemã. A primazia Alemã é apenas natural e em matéria de geopolítica a hegemonia nada mais é que legítima quando amoral. Os Alemães não são maléficos por quererem dominar, a questão está em como Portugal se poderá adaptar a este novo panorama europeu, e eu avanço que não é fazendo de Berlim nosso credor que sairemos a ganhar…